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As palavras a seguir foram escritas para pessoas específicas. Então, você está espiando um pedacinho da minha vida pessoal aqui. O texto surgiu quando eu participava de alguns grupos de Telegram entre amigos e conhecidos onde trocávamos selfies, para levantar a autoestima um do outro sem recorrer a exposição em redes sociais abertas. Com o tempo, a troca de imagens abriu espaço para mandarmos nudes também, como um espaço seguro para exercemos o olhar do tesão longe do contexto da pornografia, ou para criar confiança antes de mandar o nude para algum crush. Algumas pessoas tinham muita resistência a ideia de mandar nudes, mas concordavam em receber os dos amigos. Não parecia muito justo, afinal. Fomos descobrindo aos poucos que essa resistência era pura falta de despreendimento ou de realmente não saber como começar. É assim que o texto abaixo surge.
Como começar
Se a selfie é como você escolhe se apresentar ao mundo, o nude é o momento de captar o que você esconde dele. Com a “self-nude”, sua subjetividade pode ser exposta na medida que você escolhe. Mas por que parece tão desafiador se expor em uma nude? E por que mesmo uma selfie parece desafiadora para algumas pessoas?
É como alguns poetas de twitter dizem por aí: a arte é subjetiva, o esforço, não.
Existe uma fotógrafa chamada Vivian Maier que morou em Chicago na década de 80. Vivian trabalhou a vida toda como babá e morreu em 2009, anônima. Ela ficou famosa por suas fotos de rua e suas selfies ali pelos idos de 2013, quando um cineasta encontrou seus retratos no sótão de sua casa e resolveu fazer um documentário sobre ela. À despeito de Vivian tirar fotos de si mesma há quase quarenta anos atrás, naquele tempo em que dependíamos de rolos de filme, processo de revelação, papel de foto, etc, há uma singularidade nesses auto-retratos que dialogam com o que nós, espectadores, vemos. Há algo entre o que ela quer mostrar e o modo que ela vê a si mesma através dos nossos olhos.
A chave que conecta isso tudo, para mim, é óbvia: a fotógrafa controla essa narrativa. Ela conta sua história e nós a acompanhamos adicionando nossas experiências, achismos, reflexões.
Vamos ver algumas selfies dessa moça simpática:
(As fotografias acima são da galeria de Self-Portrait do site oficial da fotógrafa e você pode ver muito mais fotos aqui).
Vivian é uma mulher normal, suas fotos são de cara limpa e muitas vezes tiradas quase ao acaso - vide a fotografia do seu reflexo no espelho que era retirado de um caminhão por outra pessoa. Nessa mesma foto ela sorri, claramente se divertindo no momento em que capturava sua imagem. Aquele sorriso de quem sabe o que está fazendo e sabe que faz algo genial, algo que só poderia ser feito naquele momento, naquele lugar.
Seja a estrela do seu próprio filme, aconselham as pessoas que ensinam a tirar fotos no youtube. Mas se você não se vê nesse papel, tudo bem. Inclusive, se desnudar enquanto uma pessoa tímida pode ser um desafio para muita gente. Assim como revelar um traço audacioso do seu corpo que raramente você permite que os outros descubram. O truque que eu gosto de usar nos meus momentos de baixa autoestima ou vergonha é pensar que: precisamos, de alguma forma, ter domínio sobre a história que queremos contar através da nossa foto. Com isso, não falo de cenários ou de montar algo elaborado. Mas de fazer uma reflexão sobre nós mesmos e as coisas que sentimos no momento.
Se você está se sentindo perdido, sugiro que você faça algumas perguntas a respeito de si. Qual pedacinho de mim eu gosto mais de olhar? Que parte de mim eu gostaria de mostrar para outra pessoa? Quem eu quero que veja minha foto? O que eu quero sentir quando eu mesmo olhar para a minha imagem?
Essas perguntas não precisam de uma resposta: elas precisam ser vividas. Tirar muitas fotos de si ajuda muito, pois aprende-se as curvinhas, os cantinhos e os modos de se mexer que nos agradam. Procure novos ângulos. Experimente. Não há erro em experimentar, você pode simplesmente apagar a foto depois. Então, por que não?
Tirar fotos de si. Sem roupa. Ou com pouca roupa.
"Estas imagens lembram-me por que adorava estudar os autorretratos durante as minhas primeiras aulas de fotografia no secundário. Retratavam artistas, que se mostravam como queriam ser vistos, revelando algo profundamente pessoal e ilustrando algo que não podiam explicar por palavras."
Marie McGrory, em artigo para a National Geographic
É bom lembrar sempre que: você decide como, quando e o quê você vai mostrar. Não há obrigações, o controle é seu. O corpo é seu também. E o celular tem um botão de deletar que você pode usar com tranquilidade.
Espelhos podem virar seus amigos.
Usar espelho é uma forma de presentear o seu corpo com uma moldura. Repetições, formatos, pedaços: dá para fazer muita coisa com um espelho. Ou mais de um.
Fotografia é luz.
Um simples abajur num canto ou um raio de sol entrando por entre as cortinas podem fazer um arranjo interessante para suas fotos. O box do seu banheiro, uma cortina por onde se vê o contorno do seu corpo. Brinque com sua sombra. Fotos são memórias do instante da luz captada pela lente. Tudo o que refletir a luz é guardado naquele frame. Capte a luz da sua pele que você quer que reflita nos olhos de quem lhe vê.
Inspire-se.
Quando se sentir desmotivado ou sem muita criatividade, procure por fotografias e pinturas de artistas na internet. Não tem problema nenhum em repetir ou imitar outras pessoas, coisas, detalhes, elementos, ângulos e composições. Dificilmente você vai expor seu nude numa galeria de arte e vendê-lo. Nudes geralmente são para consumo íntimo.
Outras formas interessantes de fazer nudes: diferentes formatos de mídia. Um vídeo curtinho de 10s de você de toalha entrando no banho. Ou uma sequência à meia luz de você entrando embaixo do cobertor? Já pensou em fazer um gif onde você lentamente move uma perna, deixa uma calça cair, tira a blusa? Já pensou em fazer um nude em forma de áudio, revelando o que está passando pela sua cabeça, descrevendo como você gostaria de tirar sua roupa para outra pessoa?
Os olhos de quem vê
E por último, mas não menos importante: é bom lembrar que mandar nudes é uma atividade saudável, mas existe um contexto para isso. Poderia-se dizer que é uma questão de malandragem saber o momento certo, mas trata-se do bom e velho bom-senso. Mandar nudes para alguém com quem você já se relaciona é uma boa, desde que haja um contexto. E simplesmente pergunte antes de mandar.
Caso envie através de algum app que tenha versão desktop (Facebook, Telegram ou Whatsapp, por exemplo) é indispensável enviar apenas depois que a pessoa deu sinal verde de que tudo bem - evite constrangimentos para você mesmo e para a outra pessoa. Cuidado e carinho são o mínimo para com quem a gente gosta. Há outras formas de trocar os nudes de forma mais discreta, e para isso existe o maravilhoso Manda nudes: Guia Sensual de Segurança Digital - que serve também para quem tem dúvidas sobre segurança.
Outra coisa importante é: se por acaso você deixa outra pessoa mexer no seu celular ocasionalmente, lembre sempre que você guarda a intimidade dos outros ali também, e não apenas a sua.
Ps: esse texto foi originalmente escrito em 2018 e publicado no tumblr “Guia de Nudes”.
Referências externas
Trailer do documentário sobre Vivian Maier (vídeo)
Un-Selfie: Recuperar o Autorretrato (artigo)
https://www.natgeo.pt/fotografia/2018/07/un-selfie-recuperar-o-autorretrato
Suruba de dados: o troca-troca sem consentimento dos apps de encontros
https://chupadados.codingrights.org/suruba-de-dados/
How to take the perfect nude selfie (artigo, em inglês)
The art of the sexy nude selfie (artigo, em inglês)
https://www.theroot.com/the-art-of-the-sexy-nude-selfie-1821635029
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Jabás e recomendações
Estamos com o Catarse da Eita! Magazine no ar. A revista de ficção científica e fantasia que publica contos inéditos de autores nacionais em inglês. Na próxima revista, queremos entregar um texto bilíngue, para que o público brasileiro também se delicie com nosso especial sobre comida. Para quem não sabe, eu sou editora e tradutora português-inglês na Eita.
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No mais, essa semana entrei no time da revista online Querido Clássico, um site que traz artigos de sobre obras clássicas de arte, literatura e audiovisual. Quando sair meu primeiro texto lá, eu mando link por aqui e nas minhas redes.
E por hoje é só.
Beijos, abraços e toda forma de afeto.
Vanessa Guedes.
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