A loucura das listas e o bullet journal
Chegou tanta gente nova por aqui nos últimos dias! Fiquei feliz. Resolvi mandar uma edição extra, assim, no meio da semana. Mas a ideia continua sendo mandar quinzenalmente.
As pessoas sempre perguntam sobre minha experiência com bullet journal, aquele método de organizar as tarefas em listas, em uns caderninhos bem bonitos. Acho que muita gente se assusta de primeira, simplesmente porque os bullet journals no instagram são lindos. Dá vontade de ficar só olhando mesmo.
Mas não é bem assim.
A técnica é muito mais simples, porém ela é tão versátil que dá espaço para as pessoas inventarem moda o tempo todo. Tá errado? Não. Porque quem manda no seu caderno é você.
Hoje, começo aqui uma série chamada Bullet Journal Sem Fru-fru.
A loucura das listas
Textos são listas de palavras. Como leitores fluentes da língua portuguesa, esses símbolos que listo nessas frases fazem sentido para mim e para você. Uma lista é só uma lista até que a gente encontre sentido nela. Parece papo de louco, mas vem comigo que eu vou te mostrar como as listas funcionam.
Eu sou um pouco obcecada com elas, claro. Tudo começou com os guias telefônicos, que me deslumbravam com tantos nomes e endereços reais listados em uma única coisa. Depois fui pegando gosto pelos dicionários e enciclopédias, com a possibilidade de reunir tanto significado em um único objeto concreto. Como se o conhecimento da língua materna fosse algo que eu pudesse tocar e sentir. Carregar por aí. Abraçava o dicionário como que para protegê-lo. Do quê? Não sei. Talvez de mim mesma.
Existem muitas listas na literatura e nas artes em geral. Uma queixa recorrente sobre os livros do J.R.R. Tolkien, autor do Senhor dos Anéis, são as extensas descrições de elementos no cenário que o protagonista vai avistando e que são aparentemente irrelevantes para a história. Mas teriam as listas uma função narrativa? Se sim, qual? Reclamações parecidas perseguem os livros do Umberto Eco, autor do famoso O Nome da Rosa. As mais famosas, desse livro em específico, vem da descrição de certos vitrais e de uma passagem de intimidade na cozinha, que se usa de uma miríade de cânticos religiosos interpostos para criar a cena. O velho Umberto, tal como eu, também era um louco das listas.
No livro A Vertigem das Listas, ele chega lançando o escudo de Aquiles na nossa cara. Umberto usa a imagem da forma circular do escudo para mostrar um mundo com limites.
“A forma limita o universo do dito”, ele nos conta. As listas trazem uma sensação de controle, de escolha do que queremos ver ou mostrar. Nós descrevemos as coisas para nós mesmos o tempo todo: é da natureza da nossa mente processar as informações e catalogá-las. Faz parte do “dar sentido” à vida. Seres humanos tem mania de listas. Existe até toda uma disciplina para classificar a própria vida, a nomenclatura binomial na Biologia, que determina a qual classe, espécie, etc, pertence cada ser vivo que a gente conhece. O problema é que estamos descobrindo espécies o tempo todo. E assim como a lista de seres vivos, a maioria das listas que compartilhamos como humanidade está sempre crescendo.
Umberto Eco traz a imagem do escudo como o exemplo de uma lista (de imagens) com fim, exibida de tal forma que seu sentido é contido dentro do círculo que ela nos apresenta. Histórias são como o escudo de Aquiles: a sequência de símbolos constrói uma lógica que o ferreiro forjou com a intenção de passar uma mensagem. O que não se pode controlar aqui é o número de interpretações. E talvez por isso listas - assim como a escrita - causam tanta ansiedade nas pessoas.
Série: Bullet Journal Sem Fru-fru
(mas se quiser, pode!)
Na próxima newsletter, quero aprofundar as reflexões sobre listas. E para trazer esse papo para mais perto da gente, vou propor exercícios bem diretos para quem está querendo testar algo diferente para organizar o dia. E para quem está tentando engatar seu vagão no trem do Bullet Journal, mas até agora não conseguiu. Eu acredito que escrita criativa e listas de organização estão intimamente ligadas. E depois de anos pesquisando livremente sobre as duas coisas, bateu a vontade de compartilhar meus aprendizados e reflexões.
Proponho a série “Bullet Journal Sem Fru-fru” como uma prática para focar no conteúdo, na técnica, sem nos preocuparmos em fazer cadernos glamurosos para postar na internet.
Vou postando sobre o método, contando sobre coisas que eu testei (o que deu certo e o que deu errado também) e trazendo uma sugestão prática para você tentar. A ideia é que tudo o que a gente possa fazer com papel e caneta também possa ser feito no computador ou celular, assim todo mundo pode participar.
Para entrar no bonde, basta ficar de olho aqui na newsletter!
Se você sabe de uma pessoa que também vai curtir a série sobre Bullet Journal, manda o link da newsletter para ela. 😄
E para não deixar vocês sem nada para tentar enquanto os sinais da próxima edição estão sendo captados aqui na órbita, trago uma proposta de exercício criativo e organizacional. Lá vai:
Papelzinho do diabo
1) Pegue uma folha de papel ou abra um arquivo no bloco de notas do computador ou celular;
2) Escreva tudo o que você quer fazer hoje;
3) Escreva o que você tem que fazer hoje;
4) Repita o exercício amanhã. E depois de amanhã. E até quando você quiser.
Depois de no mínimo três dias, releia os papéis. Pense bem na diferença entre as coisas que você precisa fazer e as que você quer fazer.
Daqui uns dias a gente conversa de novo. Ah, e na próxima newsletter eu também te conto porque chamo esse exercício de “papelzinho do diabo”. 🔥
Dica: Ficção científica disfarçada de comédia
Esse final de semana assisti ao filme Palm Springs. Eu queria me atualizar das centenas de mensagens que se acumularam em alguns grupos no discord, mas não queria ficar no completo silêncio em casa. Então dei play em um filme que parecia bobo, para ficar passando como imagem de fundo na tv. Pois em cerca de 10 minutos, uma certa cena me chamou a atenção e eu não consegui mais parar de assistir.
O filme estrela Andy Samberg, o famoso Peralta do Brooklyn 99, meu crush secreto. E a misteriosa mother do How I Met Your Mother, Cristin Miolti. Eles fazem um par romântico nessa releitura do clássico Feitiço do Tempo (ou: o dia da marmota), com uma pegada muito mais niilista e instrospectiva, mas pouco passiva. Recomendo demais.
Para quem escreve: as submissões para a Eita estão abertas
Para quem não sabe, eu sou editora e tradutora na Eita!Magazine. A Eita é uma revista bilíngue agora. Você pode mandar seus contos de fantasia, horror ou ficção científica em português (ou inglês) para a nossa próxima edição. As submissões estão abertas até dia 16 de agosto. Confira nosso edital.
O tema da edição da vez é: comida!
Espero seu texto lá.
Momento jabá e vampiragens 🦇
Tem conto meu na nova coletânea da Rocket Editorial, Veludo & Sangue. O livro é uma homenagem à escritora Anne Rice, e além de mim e outros escritores talentosíssimos, contamos com uma história inédita do André Vianco. É, isso mesmo. Ainda estou aqui lidando com o fato de que vou estrelar num livro junto com o Vianco, de quem sou fã desde os 15 anos. É como realizar um sonho que eu nunca sonhei, já que nunca pensei que uma coisa dessas seria possível. Hehe. Segue a sinopse do meu conto:
Na intimidade das paredes do casarão, o menino Abel anseia pelo corpo da mãe enquanto ela limpa o sangue do assoalho antes do sol nascer.
Você pode adquirir o livro pela campanha no Catarse, que hoje está em 117% de financiamento. A entrega prevista do livro é em outubro - a tempo para o Dia das Bruxas, claro. Fica aí a recomendação para você já providenciar um presente diferente para você ou para uma pessoa especial. O instagram da Rocket também é super agitado, tem sempre entrevistas interessantes rolando. Segue lá.
E no mundo do podcast, temos uma viagem direto para os anos 70 no Incêndio na Escrivaninha, no nosso episódio “Canções, etanol e microprocessadores“. Com a historiadora Márcia Fráguas.
No mundo da escrita, quero recomendar as oficinas que minha amiga Ana Rüsche está ministrando para todos os tipos e formatos de escritores e textos possíveis. Acesse a lista de oficinas aqui.
Por hoje, é isso.
Beijos, abraços e toda forma de afeto possível.
Vanessa.
(twitter)(instagram)
Sent from my Tamagotchi.